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quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Crônica: "Viver o Hoje"


"Viver o Hoje" de Clarice Lispector


 Nunca a vida foi tão atual como hoje: por um triz é o futuro. Tempo para mim significa a desagregação da matéria. O apodrecimento do que é orgânico como se o tempo tivesse como um verme dentro de um fruto e fosse roubando a este fruto toda a sua polpa. O tempo não existe. O que chamamos de tempo é o movimento de evolução das coisas, mas o tempo em si não existe. Ou existe imutável e nele nos transladamos. O tempo passa depressa demais e a vida é tão curta. Então — para que eu não seja engolido pela voracidade das horas e pelas novidades que fazem o tempo passar depressa — eu cultivo um certo tédio. Degusto assim cada detestável minuto. E cultivo também o vazio silêncio da eternidade da espécie. Quero viver muitos minutos num só minuto. Quero me multiplicar para poder abranger até áreas desérticas que dão a idéia de imobilidade eterna. Na eternidade não existe o tempo. Noite e dia são contrários porque são o tempo e o tempo não se divide. De agora em diante o tempo vai ser sempre atual. Hoje é hoje. Espanto-me ao mesmo tempo desconfiado por tanto me ser dado. E amanhã eu vou ter de novo um hoje. Há algo de dor e pungência em viver o hoje. O paroxismo da mais fina e extrema nota de violino insistente. Mas há o hábito e o hábito anestesia.



Crônica Literária

  • Elaborar um conceito de Crônica Literária a partir das informações abaixo:

"A crônica faz um casamento perfeito com a fala coloquial brasileira: o tom é casual, descontraído, de conversinha miúda. Mesmo quando é lírico ou tem uma pitada de trágico, o cronista vem chegando como quem não quer nada e... vapt,  agarra o leitor pelo colarinho." - Flora Bender e Ilka Laurito.
"A crônica brasileira tem dado uma contribuição notável à diferenciação da língua entre Portugal e Brasil, pois, ligada à vida cotidiana, ela tem que apelar frequentemente para a língua falada, coloquial, adquirindo inclusive certa expressão dramática no contato da realidade da vida diária." - Afrânio Coutinho.
"A crônica é uma espécie de texto literário que aproveita os pequenos fatos do dia-a-dia. Por assim dizer, qualquer assunto serve de motivação, pois surge de histórias que o cronista ouviu, passando por um processo de adaptação, ou criadas por ele mesmo." - Admmauro Gommes.

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Crônica: "Os Antissociais"


"Os Antissociais" de Juliano Martinz

Parte I:
– Alô?
– E aí?
– Fala, grande.
– Que tá fazendo?
– Nada. Debaixo das cobertas.
– Hum. Sei.
– E você?
– Na mesma.
– Um saco, hein!
– Pois é. Liguei pra isso.
– Isso o que?
– Ah, sei lá. Tédio dos infernos.
– Pra variar né?
– Vontade acabar com isso tudo.
– Vai se matar?
– Não, anta. Vontade acabar com esse tédio.
– Vá ler um livro.
– Outro?
– É, um saco!
– E como! Já foram três essa semana!
– Putz.
– Tá afim de sair?
– Nem. Pra onde?
– A festa da facul.
– Ah, nem vou. Tô debaixo das cobertas.
– Só sair daí.
– Nem… Só saio daqui amanhã cedo.
– Eu tô afim de ir.
– Você vai?
– Não disse que vou. Disse que estou afim.
– Mas você vai?
– Ah, sei lá.
– Fazer o que lá, cara?
– Fazer o que aqui?
– Vá ler um livro.
– Putz… Você não se incomoda com isso, cara?
– Isso o quê?
– Ficar dias e dias enfiado nesse quarto. Você é um ser humano ou uma ameba?
– Ó quem fala.
– É disso que estou falando.
– Eu não sou uma ameba.
– Amebas são mais sociáveis, isso sim.
– São?
– Devem ser. São mais populares que nós, pelo menos.
– Se são. Você vai?
– Pensando. Dá medo.
– E eu não sei?
– Vai ter gente estranha pra cacete lá.
– Muita gente, isso sim.
– E estranha.
– E como! Você vai?
– Se você for, eu vou.
– Eu não vou.
– Por que não?
– Nem a pau. Muita gente. Gente estranha.
– A gente se enturma.
– Certeza?
– Bom, acho que não. Mas a gente tenta, pelo menos.
– A gente tentou ano passado, lembra?
– É.
– No que deu?
– Sujeira.
– Nem isso. Não deu foi em nada, isso sim.
– É.
– Os dois largadões lá no meio sem saber o que fazer.
– É.
– Olhando um para a cara do outro. No mesmo lugar durante duas horas.
– Se ao menos a gente soubesse dançar.
– E quem ia querer dançar com a gente?
– Pior. Fiascaço.
– E como!
– Melhor deixar essa ideia pra lá, né?
– Melhor mesmo.
– Mas, o que eu faço nessa porcaria de sábado?
– Ah, sei lá. Faça o mesmo que eu.
– OK.

Desligou, e foi ler um livro.
Um saco!

Parte II:

– E aí?
– E aí?
– Fazendo?
– Nada.
– Também.
– Vai sair?
– Nem. Cansado pra burro.
– O que fez?
– Ah, sei lá. Fiz nada, não.
– Então tá cansado do quê?
– Sei lá. Dessa paradeira, deve ser.
– Então por que não sai?
– Porque tô cansado.
– Então sai que descansa.
– Ninguém sai pra descansar.
– Então fica em casa, caramba.
– Pô, mas isso cansa pra burro.
– Cara, tu fala umas coisas nada a ver.
– Tipo…?
– Tá cansado, mas não fez nada.
– E isso não cansa?
– Então descansa.
– E o que tô fazendo?
– Então não reclama.
– Quem tá reclamando?
– Tá, deixa quieto.
– E você? Vai sair?
– Nem.
– Por que?
– Ah, você me cansou.

Parte III:

– Alô.
– E aí!?
– Fala. Belê?
– Opa. Fazendo?
– Nada. Quartão escuro.
– Abre as janelas, pô.
– Nem. Mó calor lá fora. Se abrir a janela, ele entra.
– Pior.
– E você, tá fazendo o quê?
– Nada. Só aqui no papo com minha namorada.
– Quê?
– Minha namorada virtual.
– Eita, e nem me fala nada!?
– Ah, conheci ela hoje.
– Danadão. De onde ela é?
– Sei lá.
– Não sabe onde ela mora?
– Sei lá. Mora por aí, nesses cantos.
– Conheceu como?
– Ah, sabe como é. Nos Faces da vida. Únicos lugares onde eu consigo conversar.
– Massa.
– Mas tá batendo mó medão.
– Por quê?
– Ela falou que quer me conhecer pessoalmente.
– E…?
– Ah, complicado, né cara? Sair de casa, ir pra balada, cinema, monte de gente, essas coisas. Não me dou bem nesse meio. Você sabe.
– Não devia arrumar namorada então.
– Por isso arrumei uma virtual. Mas era pra ficar só nisso. Ela lá, eu cá. Daí vem a doida e começa a complicar a relação.
– Vai enrolando, oras.
– Sei lá, acho que está na hora de encarar meus problemas.
– Tipo…?
– Sei lá. Cansei de ser dominado pelo medo, de ser só um fantoche na mão da sociedade.
– Eita, tô te estranhando.
– Sério. Vou resolver isto agora.
– Vai fazer o quê?… Ow… Cadê você?
– Voltei. Pronto, resolvi tudo.
– Sério? Marcou encontro com ela?
– Não. Terminei o namoro

Como você lida com o microcomputador?

                     Muito se tem discutido acerca da informática, de certo modo que, surgem ainda dúvidas sobre os materiais tecno...